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DROGAS: UM PROBLEMA SOCIAL, GOVERNAMENTAL, ESCOLAR E FAMILIAR 

A droga ilícita é um limbo sombrio, enrustido, silente e com efeitos devastadores. Deve ser tratada como uma questão social, de saúde pública e, imprescindivelmente, com intensa participação da família, da escola e da mídia. Nesta segunda década do século 21, vislumbro que poucos temas serão tão recorrentes quanto o álcool, a maconha, a cocaína, o crack e os alucinógenos. E é preciso criar uma consciência de responsabilidade compartilhada, pois não há como blindar a família, escola, clube ou condomínio.

Indubitavelmente, é um desafio complexo por envolver tantas frentes e exigir organização, estratégias e muita persistência na prevenção e no combate. Mas temos exemplos precedentes e resultados eficazes. Há 20 anos, começaram as medidas antitabagistas por causa dos malefícios à saúde, à estética pessoal, ao fumante passivo. A redução no número de fumantes foi de 32% para 17% da população brasileira, atingindo-se um dos mais baixos índices do mundo. O número de ex-fumantes (26 milhões) já supera o de fumantes (24,6 milhões). No início do banimento do cigarro, o fogo gerou muito calor (embates), e na sequência muita luz.

Em relação aos entorpecentes ilícitos, duas atitudes extremadas são comumente manifestadas em relação ao usuário: como um delinquente ou então como um coitadinho. Nada pior. Devemos condenar os extremos da marginalização, bem como da leniência ou lirismo, uma vez que os danos são deletérios ao usuário, além deste ser coautor dos delitos praticados pelos traficantes.

As drogas sintéticas – ecstasy e LSD – mais consumidas nas raves e na night podem ser facilmente adquiridas pela internet, nas baladas ou através dos colegas universitários. O Brasil, de 1990 para cá, apresenta um incremento de 115% no número de comprimidos apreendidos. O crack – que já se admite como epidemia – provoca dependência quase instantânea, e seus efeitos são devastadores à saúde física, mental e moral. A estimativa da OMS e do Ministério da Saúde é que existam entre 2 a 6 milhões de brasileiros usuários, e os estudos demonstram que apenas um  terço alcançará a cura, enquanto os outros dois  terços persistirão no vício, dos quais quase metade terá um fim por morte violenta. A Polícia Federal apreendeu, em 2011, o triplo de pedras de crack em comparação a 2010, sendo o preço o maior atrativo:  5 reais a pedra.

As drogas liberam no cérebro a dopamina, neurotransmissor responsável pela sensação de prazer. Vivemos em uma sociedade hedonista (do grego, hedoné, que significa “prazer”) e alguns jovens buscam na droga a euforia, ou como uma fuga dos problemas, ou pela busca de mais prazer, ou por influência dos amigos.

Os limites são necessários, cabendo aos pais estabelecer quais faixas devem ser mais estreitas, quais mais largas, e pelo diálogo demonstrar as suas convicções e modelos, respeitando as características individuais da personalidade do filho e as suas inteligências múltiplas. Muitos pais são desmedidos no elogio, ternura, conforto. Geram expectativas irreais e, certamente, o seu rebento será acometido de desmesuradas frustrações, pois ninguém valoriza a autoestima sem o complemento do esforço, trabalho, disciplina e determinação. As escolas, as igrejas e a mídia devem corroborar com o lar, na ênfase aos valores humanos fundamentais e demonstrando às crianças e adolescentes o enorme dano à saúde, à vida e o consequente desmantelamento da boa convivência familiar e social.

Em janeiro de 2012, o governo prometeu liberar  4 bilhões de reais até 2014 para o programa de combate às drogas. Parte desse dinheiro é para a criação de 308 consultórios de rua, formados por médicos, psicólogos, enfermeiros e voluntários. Esses profissionais têm a missão de se aproximar dos usuários, tratá-los como um doente crônico, ganhar a sua confiança, indicando o tratamento ou até a internação, que pode ser consensual ou compulsória (a pedido da justiça ou da equipe multidisciplinar).

Altamente relevantes esses agentes – família, escola, mídia, lideranças comunitárias e religiosas, saúde publica –, no entanto têm um papel enfraquecido sem uma eficiente ação policial. Matéria publicada pela Gazeta do Povo em 7/01/12 demonstra um paradoxo. A lei Antidrogas (11.343/06) foi promulgada com a pretensão de diminuir o número de presos, ao determinar tratamentos ou penas alternativas aos usuários. Porém, nesses últimos 5 anos, a venda de drogas tornou-se o delito mais comum, e a quantidade de detentos por tráfico teve um incremento de 166%, enquanto a população carcerária de modo geral cresceu bem menos, 36%. Esses dados demonstram que a repressão policial tem se mostrado eficaz, porém o incremento do consumo de drogas em todo o país faz com que aumente a ação dos traficantes.

Grande é o desafio no combate inclemente às drogas ilícitas, ao glamour e aos excessos da bebida. Cada problema ou nação tem sua peculiaridade, sua fita métrica em relação aos valores e costumes. Experiências bem sucedidas de outros países podem balizar nossas ações, como hoje acontece em Portugal, EUA, Holanda, Suécia, etc., que adotam uma postura implacável contra os traficantes, e aos usuários oferta-se um tratamento multidisciplinar, caso contrário internamento ou prisão.  Há motivo para otimismo, pois aqui tivemos sucesso em campanhas cujos resultados foram conspícuos – com a participação ampla de toda a sociedade – ao percorrer um espinhoso caminho na redução dos danos causados pelo tabaco, bem como contra os preconceitos em relação ao câncer, Aids, homossexualismo, afrodescendência. Todo grande problema se resolve encarando-o de frente, e não o tangenciando, muito menos o negligenciando.
Jacir J. Venturi, vice-presidente do Sinepe/PR, autor do livro “Da Sabedoria Clássica à Popular”e por 40 anos professor e diretor de escolas públicas e privadas.

Jacir Venturi
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